São muitas as causas históricas que influenciaram no
surgimento e crescimento do fenômeno do analfabetismo no Brasil. De antemão,
torna-se importante asseverar que o analfabetismo, como fato social que é, só
pode ser entendido em relação dialética com as ideologias nascidas na
infra-estrutura social que determinaram e continuam a determinar a política
educacional brasileira.
Desde o período colonial que a taxa de analfabetismo no
Brasil alcança números absurdos. Entretanto, não é da mesma época a
preocupação da sociedade brasileira com os efeitos prejudiciais de tal
índice. Estudos revelam que o início dessa preocupação é advindo de meados
do século XX, século no qual a taxa de analfabetismo chegou a 65%, fazendo com
que a parcela da população brasileira apta a exercer o direito de votar fosse
extremamente diminuta.
A origem mais longínqua do analfabetismo no Brasil está na
própria formação da economia colonial, onde uma minoria de brancos
proprietários dirigia o trabalho de milhares de escravos. Nesse Brasil sem
mobilidade social, os jesuítas se encarregaram de implantar um sistema
educacional voltado para os filhos da elite, ao passo que catequizavam índios e
negros para torná-los mão-de-obra submissa, uma vez que a política
educacional estava repleta de ideologias e métodos que perpetuavam a condição
de inferioridade de negros e índios, contrariando o sentido básico da
educação, que é de possibilitar ao educando um quadro de ascensão social.
A cidadania, por sua vez, pode ser definida como a capacidade
que o indivíduo social tem de exercitar seus direitos e obrigações da forma
mais plena possível, plenitude esta que contribua de forma significativa para a
construção de uma sociedade democrática, na qual se respeitem as condições
sociais das pessoas e que estas possam exercer seu papel cívico de forma
consciente, dispensando à ‘função cidadã’ a sua devida importância.
Dessa maneira, aflora-se a dúvida se um analfabeto está em condições aptas a
exercer tais direitos e observar suas obrigações.
A princípio, pode argüir que fica extremamente prejudicado
o direito de votar caso o eleitor não tenha a capacidade de utilizar a leitura
e a escrita para atingir o mínimo grau de consciência política, através da
qual o eleitor, alicerçado em informações indispensáveis ao exercício do
voto, contribua, na forma mais saliente possível, para a escolha dos
representantes que irão dirigir o rumo do seu Estado.
Na escala hierárquica dos problemas sociais brasileiros,
situa-se no topo da urgência e relevância o analfabetismo. Pela educação, o
homem passa a exercer seus direitos políticos, podendo escolher conscientemente
seus representantes e cobrar, eficazmente, a prática das providências
necessárias para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária.
Coloca-se, comumente, como uma das causas da defasagem do
sistema político atual do Brasil o elevado número de analfabetos. Um fato que
comprovaria tal afirmação é a existência, até hoje, de práticas eleitorais
que nos causam espanto como, por exemplo, a compra de votos ou captação
ilícita de sufrágio. Fazendo uma análise superficial, podemos até afirmar
que é bem mais fácil um analfabeto ter seu voto comprado em época de
eleições do que um cidadão alfabetizado, visto que aquele não tem a
oportunidade de se informar acerca dos candidatos. No entanto, entendemos que o
analfabeto é alvo quase certo dessa prática eleitoral ilícita não
necessariamente pela sua condição de iletrado, mas sim pela sua condição
econômica. Assim, devido à grande parte dos analfabetos encontrar-se em
situação de miséria periclitante, um "punhado" de feijão vale bem
mais do que um voto para os que vivenciam a miséria extremada.
Não se pode esquecer que para que se obtenha a existência
de um sistema democrático na verdadeira acepção de sua expressão, devemos
partir do pressuposto da incidência da participação de todos os indivíduos
sociais nos destinos do governo. Tal participação dar-se através dos direitos
políticos.
Pode-se definir direitos políticos como sendo o complexo de
direitos que possibilita à pessoa a participar livremente dos negócios
políticos do seu Estado, investindo-se, dessa maneira, de um direito público
subjetivo. Vale ressaltar que os direitos políticos encontram-se estritamente
atrelados, do ponto de vista objetivo, à configuração da cidadania.